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Luto

Luto pra não me entregar. Luto por não haver mais nada. Luto pra esquecer. Luto por lembrar. Luto por ter me perdido. Luto pra me reencontrar. Luto cansado, desgastado, repetidamente em frangalhos. Luto por palavras doces dissolutas. Luto por dores amargas e resolutas. Luto pela batalha perdida. Luto pelo sal na ferida. E ainda assim, luto. Luto para me apegar às coisas ruins – mas é pelas boas que o luto se justifica. Luto pra achar uma ilha onde eu já vivi. Luto contra a correnteza, contra a gravidade sufocante e convidativa do fundo. Luto para segurar o leme, para manter o rumo e aprumar as velas. Luto pra não acender uma vela. Luto por conter a chama. E, sobretudo, luto para manter o verbo e afogar o substantivo.
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Rio pra não chorar.

 O Cristo me rendeu. Quedei-me ajoelhado diante do seu esplendor. Nessa cidade, me mudei. A necessidade me mudou. O coração tenta se desligar e ligar em cada batida. A rua pulsa, vibra e pisca. Nada é tão fácil. Nada é tão difícil. Nadar é que é necessário. Contra correntes ou a favor delas. Estou achado de amor! Voltei pra mim. Saudade grande. Aposto na Sena que ninguém me entende cristalinamente. Aceno. Dei vinho ao meu desejo e ele não me deu ressaca. Acho que sei beber. Um mar de ressaca invadiu a praia. Loucura normal. O medo... Ah, o medo! Seria um bicho? Seria um monstro? Sujeitos ocultos cada vez menos ocultos: eu, ele, você. Nós rezamos a mesma oração. As verdades, as mentiras. As cores e as trapaças: as flores e a desgraça. Só as rosas são sinceras.

Typo assim

Eu me afoguei em lágrimas que nunca chorei. E bebi da água que sempre evitei. Um Rio inunda minha cabeça. Mil igarapés me aconselham: vozes difusas me apontam decisões difíceis. Um jogo, uma competição, tudo se diz puta! Só eu e meus escritos me dão prazer. Um reencontro talvez me afague – e eu não me afogue na banalidade do ser. Eu tenho medo de não dar conta. Eu tenho medo da minha conta. Eu tenho medo de ser refém da minha conta. O medo me dá muitos presentes, mas está na hora de eu os negar! Tudo agora é uma obrigação: falsa liberdade. Você é obrigado a tudo: do respiro ao suspiro, de manter a paz, de evitar os Guerras. Os Dias não têm culpa de nada. Eles sim são presentes. Procuro dois pra lá e dois pra cá. Modelos, hoje, me nauseiam. Tenho medo de baleias, mas amaria sê-las – te entendo, Letícia. E admiro muito o seu trabalho. Toc, toc... Quem é? Sou eu. Vim aqui para lembrar você daquela sensação. Do toque suave do sol na pele nua. A entrega nunca antes vista na rua. A falta de

Modelo

Pessoas procuram modelos para se apegar. Não há nenhuma novidade nisso. Seguiria eu também o meu próprio modelo? Certa vez ouvi um sábio dizer que os loucos abrem caminhos que mais tarde serão percorridos pelos sábios. Mal sabia ele que mesmo se achando louco, ele, na verdade, já era um sábio por percorrer caminhos já previamente sabidos, trilhados. Seguiria ele também seu próprio modelo? Até onde é a autonomia daquele que diz que não segue modelos? Seria possível ainda haver novos caminhos a se descobrir? É por esquecer do óbvio que o trágico acontece. É por errar o caminho que uma estrada se tece. Talvez seja ímpar viver em par. Talvez casar não seja o caso. Talvez transar não seja um caso. Talvez uma carreira de sucesso não faça sentido nas ruas de Olinda. Talvez em São Paulo, faça. Talvez uma viagem pra Índia is not your thing . Talvez o anonimato lhe seja abominável. Morar no mato, ou na cidade, ou embaixo da ponte,  ou embaixo d'água, ou em outro planeta ou em outros... model

Liquidifica dor

Misturo tudo dentro. Ponho coisas doces, amargas e o saudoso sal. Todas as cores lindas do arco-íris. Às vezes queria ter um liquidificador na minha casa nova, mas me contentaria com uma luz difusa – por enquanto. Em quanto tempo tudo se decanta? Ou tanto faz já que tudo encanta? Finjo não importar. Ajusto a velocidade e me assusto com ela. Tudo vibra. Ponho meu bloco de manteiga na rua e bato mais um pouco essa história louca. Infelizmente o medo aparece. Medo de tudo. De tudo! E ele, o medo, desonera minha arte.  Aparta-me do nexo, apela-me ao sexo, aperta-me o plexo! É tanto tempo, é tanta coisa, é tanto tudo que me afugenta o nada. Um zunido me azucrina. Mas o nada é preciso! É precioso! Paro e reparo os líquidos ao redor do olho do corpo do oceano. Prefiro a calmaria do fundo. Quase me afogo no mundo. Lembro-me de que nada disso é real. Tudo não passa de um pesadelo. Pesares... e deleites fazem parte da receita. A pergunta que fica, na verdade, é se só nos resta aceitar que é mel

Colar de prata

Não é sua palavra que me amarga, é a saliva. Sentida e consentida, travando nossas gargantas. O silêncio já tem novas cores, eu sei. O bote assusta, mas é efêmero. O veneno  é o que machuca e permanece. Não é o olhar que me afugenta, é o medo de ficar cego. Tateio minhas lembranças com a carne. Pelos, lábios, encontro, minha – nossa! – tara. Há um mistério que eu vou descobrir, é iminente. Eu não estou preparado para ele, posso sentir. Mas nada está preparado para coisa alguma! Não dá nem pra parar, avalie pré-parar ! O balanço final nunca é final, afinal. Mudei-me de mim mais uma vez. Desmontei tudo e empacotei em baús. Na mudança, acabei encontrando aquele colar de prata que você me deu. Ele se oxidou. Mas não desisti dele. Pela polidez, descartei o sujo e remocei o brilho. Hoje reflito na prata: minha paz é ouro.

Tempo de Pipa

Ela permanecia ali em seu galho só observando aquela comédia. De todas as suas crias, ela sabia que aquela era de longe a mais risível. "Ora, 40 mil anos e continua se achando o ápice de tudo que vive! Como é engraçada essa criatura!" soluçava de tanto rir, aquele ser de idade incerta. "Eu lhes coloquei 7 buracos na cabeça para absorver tudo ao redor, mas não adiantou. Veja, por exemplo, eu lhes dei a praia de Pipa belíssima para ser apreciada. Águas mornas e paisagens inebriantes. Mas eis que, quando estão lá, eles só apreciam a si mesmos. Nas fotos, por exemplo, desfocam o presente que lhes dei, deixando-o meramente como plano de fundo borrado numa foto igual a tantas e tantas outras..." e refletiu um pouco "basta um zap meu para o Sol e tudo que é celular acaba..." E continuou "Eu vou passar cerol na mão. Vou sim!" E voltou a gargalhar.